Disputas nos estados contradizem e travam avanço de federações partidárias

A dinâmica das disputas regionais é um dos principais entraves para o avanço das federações partidárias, que terão pouco menos de três meses para serem consolidadas para as eleições de outubro. Este período deve ser marcado por um acirramento de tensões entre as legendas que negociam parcerias, já que em alguns casos elas têm candidatos concorrendo entre si ou caminham em direções que contradizem as alianças costuradas em âmbito nacional. Ao menos 12 partidos discutem possíveis federações —novidade desta eleição, que obriga a uma atuação conjunta na legislatura que vai de 2023 a 2026. Além das disputas em torno de palanques regionais, estão no tabuleiro peças como o poder decisório de cada partido dentro das federações.

No campo da esquerda, estão em curso negociações para duas federações —PT, PSB, PC do B e PV é a primeira e maior delas. A outra envolve PSOL e Rede. O PDT de Ciro Gomes não tem travado conversas sobre federação. Embora essas siglas de esquerda tenham proximidade histórica e ideológica, elas enfrentam dificuldades em acertar os ponteiros nos estados.

PT e PSB, por exemplo, ainda não chegaram a um acordo em São Paulo e Rio de Janeiro, dois dos maiores colégios eleitorais do país. Em São Paulo, Márcio França (PSB) e Fernando Haddad (PT) travam uma disputa para quem vai concorrer ao governo do estado e indicam que não abrem mão de suas candidaturas. No Rio, o PSB trabalha o nome do deputado federal Marcelo Freixo, mas uma parcela do PT abriu um novo flanco de negociações que envolvem o PSD do prefeito do Rio, Eduardo Paes, e o PDT do ex-prefeito de Niterói Rodrigo Neves. Também há entraves em Rio Grande do Sul, Rondônia e Santa Catarina, onde os dois partidos sinalizam para candidaturas próprias, além de Alagoas e Paraná, onde caminham para estar em palanques opostos.

Em Alagoas, por exemplo, o PT está alinhado com o governador Renan Filho (MDB), que deve concorrer ao Senado. Por outro lado, o PSB pode lançar o prefeito de Maceió João Henrique Caldas, adversário ferrenho dos Calheiros, ao governo ou apoiar o senador Rodrigo Cunha (PSDB) para o cargo. No PSB, também há resistências em diretórios como o de Tocantins, que defendem que o partido não feche federação com nenhum partido. “Depois de tanto trabalho de autorreforma e reflexão, o partido terminar virando um puxadinho do PT seria muito triste. Não podemos ser medrosos ao ponto de não enfrentar o desafio de crescer sem a federação”, afirma Carlos Amastha, presidente estadual do partido e ex-prefeito de Palmas.

Por enquanto, os dois partidos têm aliança encaminhada na Bahia, Pernambuco e Sergipe e devem trilhar o mesmo caminho no Ceará e em Minas Gerais. Governado pelo PSB desde 2007, Pernambuco é a prioridade número um do partido: o deputado federal Danilo Cabral foi referendado como pré-candidato ao governo.

A Bahia é o maior estado governado pelo PT e o apoio do PSB está assegurado. Mas não sem baixas: depois de 16 anos ao lado dos petistas no estado, o deputado federal Marcelo Nilo (PSB) rompeu com o senador Jaques Wagner (PT) e caminha para apoiar a candidatura de ACM Neto (União Brasil) ao governo.

A lei que criou as federações partidárias foi validada na última quarta-feira (9) pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que definiu o prazo final de 31 de maio para que as siglas possam se unir neste ano. Nas federações partidárias, as legendas que se associam são obrigadas a atuar de forma unitária ao menos nos quatro anos seguintes às eleições, nos níveis federal, estadual e municipal, sob pena de sofrerem punições.

É um modelo diferente das coligações, que previam uma união apenas para disputar as eleições e foram vetadas em eleições proporcionais. Um dos objetivos das federações foi justamente o de estabelecer um relativo drible ao fim das coligações e dar a partidos médios e pequenos mais chance de superarem a cláusula de barreira. Neste ano ela exigirá a obtenção de ao menos 2% dos votos válidos nacionais para a Câmara ou a eleição de pelo menos 11 deputados federais em nove estados.

Partidos que não obtenham esse desempenho ficam sem verba pública e tempo de propaganda na TV. No caso de federações, é considerada a soma dos votos dados a todas as legendas que a integrem. No campo do centro e da direita, a União Brasil abriu conversas entre dirigentes para uma possível federação com o MDB. Mas, para isso, terá que primeiro superar uma série de divergências internas geradas a partir da fusão de DEM e PSL.

Secretário-geral da União Brasil, o ex-prefeito de Salvador ACM Neto diz que o novo partido deve aparar arestas internas até o dia 2 de abril para, a partir daí, acelerar as tratativas para a eleição nacional. Adiantou que a formação de uma federação com o MDB é vista com simpatia, mas o xadrez é complexo.

“É preciso organizar nos estados. É simples? Não, é complexo. Vai ter ou não? É cedo. Eu fiz um processo que muita gente não acreditava, que era a fusão. [A federação] é uma quase fusão provisória. São muitos interesses em jogo”, avalia. O principal entrave para união está exatamente nos estados no Nordeste, onde o MDB caminha para se alinhar à candidatura de Lula em ao menos sete estados, incluindo Ceará, Pernambuco e Alagoas. Já a União Brasil inclina-se nacionalmente mais para o lado de Jair Bolsonaro (PL), como é o caso de Ronaldo Caiado em Goiás. Curiosamente nesse estado os dois partidos estão alinhados. O ex-deputado federal Daniel Vilela (MDB) será candidato a vice na chapa de Caiado (União Brasil), que disputa a reeleição.

Em São Paulo, União Brasil e MDB também estão alinhados na adesão à candidatura de Rodrigo Garcia (PSDB) —palanque que nacionalmente é do presidenciável tucano João Doria. Ao mesmo tempo em que abriu conversas com a União Brasil, o MDB também discute a possibilidade de uma federação com o PSDB. Mas a parceria entre os dois partidos, pacífica em São Paulo, também emperra nos planos de caciques locais. No Distrito Federal, por exemplo, o senador Izalci Lucas (PSDB) já está em pré-campanha para enfrentar nas urnas o governador Ibaneis Rocha (MDB), que tenta a reeleição. Os dois partidos também são adversários históricos e devem estar em lados opostos em Alagoas. Mas há movimentos de aproximação em outros estados.

O caso mais emblemático é o de Mato Grosso do Sul, onde os dois partidos eram adversários. Em dezembro, uma aproximação foi selada com a nomeação pelo governador Reinaldo Azambuja (PSDB) do deputado estadual Eduardo Rocha (MDB) para a secretaria de Governo. Ele é marido da senadora e presidenciável do MDB, Simone Tebet. Ameaçado pela cláusula de barreira, o Cidadania negocia uma possível federação com o PSDB. Ao mesmo tempo, também tem conversas em andamento, de forma separada, com o Podemos. Criado a partir de uma costela do antigo Partido Comunista Brasileiro, o Cidadania teve nos últimos anos maior afinidade política e ideológica com o PSDB. Mas uma possível parceria com os tucanos poderá resultar na desfiliação do único governador do partido –João Azevêdo, da Paraíba.

Filiado ao Cidadania em janeiro de 2020, Azevêdo ajudou a robustecer o partido na Paraíba. Na eleição municipal, a legenda saiu de 1 para 46 prefeitos no estado e tinha como meta eleger ao menos dois deputados federais em 2022. Mas o debate sobre a federação embaralhou o jogo. Azevêdo disputará a reeleição e deve apoiar o ex-presidente Lula ao Planalto. Para complicar, um de seus potenciais adversários é justamente um tucano: o deputado federal Pedro Cunha Lima, filho do ex-governador Cássio Cunha Lima.

“Se confirmar a federação entre Cidadania e PSDB, ou sai a gente ou saem eles. Não tem como conviver”, afirma Ronaldo Guerra, presidente estadual do Cidadania.

João Pedro Pitombo e Ranier Bragon / Folhapress

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